domingo, 16 de fevereiro de 2014

Terapia

- Doutora, eu estou vendo coisas.
- Que tipo de coisas?
- Coisas que não deviam estar ali, sabe. Coisas que não deviam existir.
- Mas para você elas existem, não é?
- Quem dera fosse só pra mim.
- Isso está atrapalhando a sua vida?
- Você nem imagina como. Elas me dizem como tenho que me vestir, o que comer, como me comportar, como usar meu cabelo, com quem eu falo, onde vou e que horas.
- E quando isso começou?
- Eu não me lembro bem, eu ainda era muito pequena. Até os meus brinquedos eram essas coisas que escolhiam. Eu rezava para que me dessem outras coisas, mas nunca aconteceu. Eu achava que quando eu crescesse ia passar, mas só piorou. Tá em todos os cantos. Hoje mesmo mais cedo, eu estava cansada, chateada, puta da vida. Mas essas coisas ficavam me dizendo para sorrir. Eu não aguento mais, doutora! Por favor, me dopa e me dá uma passagem só de ida para o país das maravilhas.
- Não é assim que funciona, é muito cedo para te medicar. Precisamos trabalhar mais nisso.
- Doutora, fica pior a cada dia. Quantas sessões ainda?
- Não dá pra dizer. Me fale sobre sua família, ela sabe sobre isso?
- Claro que sabem. Eles dizem que eu sou louca, que não tem nada ali. Eu as vezes me arrependo de ter contado pra eles. Você nem imagina como minha mãe chorou e meu pai, meu pai quis me internar na hora.
- Eles te internaram? Não, uma tia minha conversou com meu pai, disse que era só uma fase, que ia passar logo.
- Eu acho que já acabou o tempo. Vou estudar a fundo o seu caso. Até lá você pode tomar 0,25 mg de alprazolam, três vezes ao dia, só para reduzir um pouco sua ansiedade, ok?
- Ok, obrigada doutora, até semana que vem.